Desistir é a única forma real de fracasso, mas muitas vezes ela é disfarçada pelo sucesso.
Eu sei, você pode estar pensando. Ou ele escreveu errado esta frase, ou enlouqueceu de vez, pois contém uma evidente contradição. Como poderia se falar de um fracasso disfarçado pelo sucesso? Afinal de contas, se é um sucesso, é um sucesso, não pode ser um fracasso.
Correto?
Errado!
A vida (felizmente) não é uma prova objetiva de múltipla escolha, em que somente uma das opções é correta. Se assim fosse, ficava fácil, era só acertar, sucesso, errar, fracasso, tão simples quanto isso.
Mas a vida não é tão simples quanto isso, ainda que tentemos simplificar.
Simplificamos porque muitas vezes preferimos nos enganar marcando uma resposta certa, ainda que não tenhamos aprendido nada com isto. Preferimos isto a imaginar que não existe um certo e errado, que qualquer caminho é caminho, basta que seja autêntico e que vivamos ele de forma real.
Trocamos felicidade por certezas.
O emprego não está bom? Mas este eu conheço, outro pode ser pior.
O relacionamento está falido? Mas já estou adaptado, sei lidar com as dificuldades, não sei o que esperar em novos relacionamentos.
E vamos trocando felicidade por certeza.
Ainda que o certo nos traga infelicidade, temos esta incrível preferência pela certeza.
Ouvi uma estória muito boa em um podcast.
Duas pessoas estão perdidas e seguindo por uma trilha, elas estão sem água. Até que uma delas desiste, resolve não prosseguir mais, ainda que logo à frente tenha uma curva, ou seja, ela não sabe o que tem logo mais à frente. Este primeiro desistiu e se convenceu que não há o que fazer, que não há agua, que não há saída. Mas o segundo acredita que encontrará água e a saída, está convicto disso, e sequer passa em sua cabeça deixar de seguir na trilha. O segundo faz a curva, e encontra logo em seguida, andando mais alguns metros, uma fonte de água. Ele bebe da fonte, enche um cantil e retornar para onde ficou o primeiro, lhe dá água, mas ainda assim o primeiro não avança, ele prefere acreditar que o segundo recebeu algum benefício, talvez até sobrenatural, deve ser alguém mais digno de ajuda, de sobrevivência, então, o primeiro se resigna a ficar onde está, certo de que não há saída, não importa o que o segundo lhe diga, afirmando existir abundância de água se ele resolver seguir em frente.
Eu sei, a estória é bem simplista, e você apressadamente pode julgar ser boba, e que a pessoa que não vai atrás da fonte só pode ser muito tolo.
Mas reflita na vida. Na sua própria, na de conhecidos.
Quantas vezes você não age como aquela primeira pessoa? Você fica paralisado pela sensação de escassez no mundo, pela sensação de que você tem menos valor.
Voltando aos nossos exemplos.
O emprego não está bom. Mas ficamos nele, pois somos vencidos pela visão de escassez. Conseguiremos outro emprego? Haverá coisa melhor? Todo emprego deve ser ruim mesmo. Também somos vencidos pela sensação de falta de merecimento. Melhor ficar neste emprego mesmo, porque não sinto que tenha habilidades e competências para um emprego muito melhor.
O mesmo com relacionamentos. O mesmo com tudo na vida.
Vamos nos aprisionando por uma visão de escassez e por uma sensação de falta de merecimento.
Tá, mas e aquele papo de o sucesso iludir o nosso fracasso?
Posso me usar como exemplo.
Estive advogado por 20 anos, dono de meu próprio escritório nos últimos 10 destes 20 anos, eu era reconhecido nacionalmente nas minhas áreas de atuação, e ainda tinha uma ótima performance financeira, ganhando dinheiro com o que fazia.
Você pode logo dizer. Sucesso!
Exatamente. Você está certo. Mas que sucesso? Qual a régua? Pelo olhar de quem?
Pela régua de medida da sociedade de uma forma geral, em que fama e dinheiro determinam o sucesso ou fracasso, realmente, eu era um sucesso.
E minha vida pessoal? Saúde?
Eu tive quase um infarto, minha saúde estava aos pedaços, tanto física quanto mental, até porque também quase nunca tirava férias, vivia em torno do trabalho, acreditando que enquanto fosse admirado por todos externamente, estaria tudo certo, eu era um sucesso, estava vencendo.
Eu venci no jogo exterior, mas perdi no jogo interior.
Entendeu agora?
Eu havia desistido, eu era um fracasso, mas o sucesso (exterior) me iludia, não me permitia tomar uma decisão e um novo caminho.
Apesar de ser um sucesso pelos olhos de fora, eu tinha minhas próprias lutas internas com relação à escassez e sensação de merecimento.
Acreditava que o mundo era realmente difícil, um lugar de poucas oportunidades, que o dinheiro era algo muito duro de se obter, e apesar de reconhecer várias competências, não acreditava totalmente que eu poderia começar de novo, crescer em outras oportunidades.
Eu havia desistido. Eu somente não queria caminhar até a curva, andar mais alguns metros, e confirmar que realmente o mundo é de abundância, e que eu sou merecedor.
Não existe fracasso em seguir em frente, nunca, pois mesmo derrotas são somente aprendizados corrigindo nosso rumo.
A desistência é a única forma de fracasso.
E o sucesso, pode ser a maior razão da desistência e do fracasso.
Abundância e merecimento, os combustíveis contra a desistência.
Faça a curva, não deixe nem o sucesso te parar.